O Periódico Opinioso do Castelo da Curva do Rio
Trazendo pensamentos, lembranças, informações, entrevistas, comentários, o passado, o presente, o futuro e a narração de casos verídicos, em sua maioria fantasiados, escritos em prosa e verso pelo Segrel Paraibano Igor Gregório
Data: Vinte de fevereiro de dois mil e vinte quatro
Título: O Castelo da Curva do Rio
Hoje trago ao elevadíssimo Leitor um texto acerca da criação do meu castelo literário, o Castelo da Curva do Rio. Originalmente, este texto foi publicado no meu primeiro livro de poemas, o Alma-de-Gato no Voo da Alvorada (Editora União, 2023).
Todavia, ao trazê-lo para esta coluna eu acrescentei algumas imagens e informações que não havia no texto original. Primeiramente, porque evoluí em algumas percepções. Em segundo lugar porque aqui tenho mais espaço editorial para divagar.
Sendo assim, vamos ao texto:
Alguns poetas nordestinos, desprovidos de capas e espadas, e influenciados por séculos de colonização europeia, guerreavam e elevavam a sua coragem nas pontas das línguas ou das canetas. Cantadores Repentistas ou Poetas de Bancadas, os famigerados cordelistas, esgrimiam em duelos versificados pondo em risco seus castelos imaginários, que também podiam se traduzir em seus domínios físicos, no caso, as suas ribeiras de origem.
Nestas pelejas imaginárias, ou reais, pelas estrofes, discorriam sobre a grandeza de suas magníficas fortalezas e sobre os seus territórios mitológicos. Na maior e mais afamada peleja de todos os tempos entre Inácio da Catingueira e Romano do Teixeira podemos ter uma noção destes maravilhosos embates:
Romano
Inácio, tu me conheces,
e sabe bem quem eu sou.
Eu posso te garantir
que a Catingueira inda vou!
Vou derrubar teu castelo
que nunca se derrubou!
Inácio
É mais fácil um boi voar,
um cururu ficar belo,
aruá jogar cacete
e cobra calçar chinelo,
do que haver um barbado
que derrube meu castelo!

É interessante notar que como esta peleja data da segunda metade do século XX, logicamente, naquele tempo não existia gravador, dessa maneira, os dois únicos modos de propagá-la eram o boca-a-boca e folheto de cordel. E assim foi feito.
Pois bem!
Eu, como uma criatura que vive com a mente mais no passado do que no presente, sempre fui encantado pelo medievo europeu e suas históricas fantásticas que narravam as aventuras de nobres cavaleiros e poderosas donzelas. Deixo aqui alguns, entre tantos, assombros que tive em minha vida e que contribuíram, e contribuem, para este encantamento: Quando criança, assisti os filmes Coração Valente (1995), Robin Hood, O Príncipe dos Ladrões (1991) e O Nome da Rosa (1986), e já mais velho li os livros O Senhor dos Anéis de J.R.R. Tolkien, As Crônicas de Artur de Bernard Cornwell, O Nome da Rosa de Umberto Eco e o Romance da Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta de Ariano Suassuna.

Capa do Livro Romance d’A Pedra do Reino de Ariano Suassuna
No livro do Mestre Ariano a narração da história fica por conta da personagem Dom Pedro Diniz Ferreira Quaderna. Desprovido de coragem e de habilidades cavalarianas, Quaderna relata que edificará o seu Reino não na base da valentia, da força ou do sangue, mas na base da Literatura! Quaderna, que é um megalomaníaco essencial, deseja, a partir da construção deste Reino Imaginário (ou real), se tornar o Gênio da Raça Brasileira e quiçá do mundo. Foi neste belíssimo e divertido livro que se formou a conexão com todo este sentimento já existente, de deslumbramento pelas histórias fantásticas medievais que eu possuía dentro de mim, com a nossa poética nordestina. Pois, Ariano, através de Quaderna, nos apresenta no livro as várias influências que os romances medievais portugueses tiveram em nosso excelentíssimo Romanceiro Nordestino.
Dessa forma, eu, que também sou desprovido de valentias e de força, e um pouco megalomaníaco, resolvi criar também o meu castelo literário e nele edificar toda a minha produção artística. Eu, que nasci na capital da Paraíba, fui levado, logo nos primeiros dias de vida, para casa de minha Avó materna. A casa se localiza numa cidade, de nome bastante peculiar, chamada Bayeux. Lá passei minha infância e é de lá que aludo o nome do meu castelo, pois a simplória cidade emerge justamente nas beiras do Rio Paraíba, o rio mais aguerrido do mundo! Horas! Juntando tudo isto que narrei, mais o fato da casa de minha Avó se localizar à uma rua do Rio Paraíba, mesmo ali, na curva que o conduz até a sua foz, na cidade praiana de Cabedelo, nada mais justo que o meu castelo tenha o épico nome de: Castelo da Curva do Rio!

Bandeira do Castelo da Curva do Rio
E assim, na forma da Primeira Torre Interna do meu castelo literário, a Torre-da-Natureza, brota o meu primeiro livro: o Alma-de-Gato no Voo da Alvorada! Esta torre faz parte de um marco maior formado por sete torres internas e sete torres externas. Torres estas edificadas com as Pedras da Verdade e adornadas de versos, prosas, romances, folhetos, histórias fantásticas, canções e gravuras!
Na primeira torre proponho ao elevadíssimo leitor alçar voo junto ao pássaro que escolhi para representar a minha poesia, o Alma-de-Gato. Juntos sobrevoaremos o que eu julguei de melhor em minha verve. Nesta torre está o aprendizado de anos de estudos e inspirações; nela estão as marcas de uma vida, dos sorrisos às lágrimas; nesta torre está o início do meu Castelo Literário, erguido, magnifica e magistralmente, no solo perenal da Parahyba!

Dessa maneira, conclui o texto de apresentação do meu livro. Mas como disse, o pensamento evolui e constantemente bate asas no mundo do Sonho. E foi sonhando que decidi o local físico do meu Castelo, caso ele venha a existir.
Meu amigo e poeta Siéllysson Francisco sempre bate nessa tecla comigo: “Vou visitar seu castelo, quando você construir”! E foi também por indicação deste meu querido amigo que li o livro de Elias Herckmans, Descrição geral da Capitania da Paraíba, datado de 1639. No livro, o holandês descreve detalhadamente sua passagem pelo nosso chão. Após a leitura decidi que se um dia eu vier a construir fisicamente o meu castelo será ele erguido nas terras santa-ritenses.
A riqueza histórica da cidade de Santa Rita, devida a sua profícua malha fluvial, é o chão perfeito para que um castelo seja erguido. Assim, em umas das incontáveis curvas que o Rio Paraíba faz, meu castelo estará intimamente ligado ao berço que formou a Paraíba como conhecemos e amamos hoje.
Tudo isso, logicamente, está no campo do sonhar, mas é sonhando que se constrói. Por isso afirmo: do meu castelo poderei contemplar uma terra em que Tapuias e Potiguares andavam sentindo a brisa dos rios e o barro negro e úmido da terra. Dele irei observar as belas construções barrocas edificadas com as bênçãos da igreja e o dinheiro dos engenhos. Dele irei contemplar as rareadas águas do Rio Paraíba correndo para o mar, águas essas que tanto acalentaram os pretos, e acalentam os seus descendentes, que, forçados, aportaram nesta terra. No meu Castelo serei Rei, mas não terei súditos, pelo contrário, dou a minha palavra que serei um vassalo incondicional da poesia!
Pelas margens que vertem bem querer
e na folha infinita do amor,
eu descrevo meu canto de louvor
com a pena serena do prazer.
Pelas águas que tecem o meu ser
eu me banho buscando meu brincar.
E na fonte, que verte sem parar,
minha lira encontra seus cristais!
Pelas linhas de versos surreais
meu Castelo eu hei de edificar!
Nunca soube direito aonde ir,
nem ao menos sabia amanhecer.
Pelas noites vaguei até morrer
para em verso, além, eu ressurgir.
Aprendendo, buscando convergir,
acordei desmedido e sem ar.
Arquejando busquei o meu pensar
para assim respirar meus ideais!
Pelas linhas de versos surreais
meu Castelo eu hei de edificar!
Encontrado, provei todo sabor
que procela na boca a sorrir.
Pois contente eu tive meu florir
nos jardins coloridos do compor.
E compus mil poemas em louvor
à riqueza que há em nosso lar.
Foram linhas verdosas a cantar
matagais, manguezais, canaviais!
Pelas linhas de versos surreais
meu Castelo eu hei de edificar!
Finalmente, se erguem sem temer,
sete torres repletas de primor.
São ungidas nas mãos de um senhor
que, no verso, ensinou como viver!
Sete vãos já acolhem sem tolher
mil palavras que botam pra lascar.
E com sete mais sete, meu sangrar,
reafirma desejos imortais:
Pelas linhas de versos surreais
meu Castelo eu hei de edificar!